Peck Advogados

Em novembro de 2021, o Ministério Público Federal instaurou inquérito civil com o objetivo de investigar se os provedores de aplicação violam direitos fundamentais diante da crescente de desinformação e violência nas redes. O inquérito surge diante da necessidade de averiguar a criação de organizações para propagar desinformação, assim como os possíveis incentivos financeiros que permitem o favorecimento de tais conteúdos nas plataformas.

Naquela ocasião, o MPF já oficiou WhatsApp, Telegram, Facebook, Instagram, Twitter, TikTok e Youtube a apresentarem informações, como os três últimos relatórios de transparência e as providências adotadas para mitigar práticas de desinformação.

Agora, diante da concessão do selo de verificação para usuária conhecida por transmitir conteúdos desinformativos relacionados à pandemia de covid-19 na plataforma, o Twitter recebe novo ofício do MPF para esclarecer (i) informações sobre a forma de denúncia de conteúdos desinformativos sobre a pandemia e o motivo pelo qual o instrumento específico é disponibilizado em outros países e não no Brasil e (ii) os critérios para conceder o selo de verificação aos usuários.

Desta forma, o MPF expande o pedido inicial com relação ao Twitter, mas faz solicitações que já deveriam ter sido explicitadas pela plataforma. Veja que o Twitter tem uma política própria de combate à desinformação sobre a covid-19, o que indica uma preocupação da plataforma com o assunto. Contudo, é preciso que a preocupação seja revertida em ação, e que a postura de combate irrestrito à desinformação da plataforma seja igual entre os países.

O selo de verificação, como indica o próprio Twitter, “informa às pessoas que uma conta de interesse público é autêntica”, ou seja, é um meio de demonstrar que aquele usuário é verdadeiro, notável e ativo na rede. Assim, é contraditório que, por posturas internas, o Twitter estabeleça, em uma via, que conteúdos falsos ou enganosos que prejudiquem a saúde pública podem ser removidos na sua plataforma e, no outro lado, conceda o selo de verificação para perfis que têm conduta duvidosa quanto às postagens sobre covid-19.

Com o pedido do MPF, pode-se esclarecer em que medida o Twitter segue a sua política de combate à desinformação, assim como verificar, de forma expressa e transparente — ao contrário do que ocorre hoje —, quais são os requisitos necessários para ter uma conta verificada. Com base em tais informações, será possível fazer um melhor balanço da transparência da plataforma.

Inclusive, é preciso mencionar que o ofício do MPF já apresentou resultado, mesmo que indireto. Em 17 de janeiro deste ano, o Twitter anunciou que o mecanismo de denúncia de informações potencialmente enganosas da plataforma também está disponível no Brasil, pois, antes, somente estava presente nos Estados Unidos, na Austrália e Coreia do Sul. A ausência de disponibilização desse mecanismo no Brasil tinha sido um dos questionamentos do MPF, que ainda pende de esclarecimentos relacionados a outros itens.

O plano de fundo dessa discussão é a transparência, que é um dos focos principais da discussão sobre regulação das plataformas. Atualmente, temos o PL 2630/2020, cujo substitutivo aguarda votação na Câmara dos Deputados; se transformado em lei, poderia ser aplicado ao caso, diante do número de usuários do Twitter no Brasil.

Com base nesse PL, o Twitter teria por responsabilidade compartilhada, por zelar por uma esfera pública, livre, plural e democrática, que fundamentaria legalmente, no âmbito principiológico, a necessidade de estabelecer meios de combate à desinformação. Igualmente, a plataforma teria por obrigação ser transparente sobre os procedimentos de aplicação das suas políticas, inclusive sobre a concessão do selo, e cumprir com a apresentação de relatórios que comprovem a forma de aplicação de medidas de moderação de conteúdo.

O MPF, em certa medida, já “testou” os ditames do PL 2630/2020 quando, no primeiro ofício, determinou que as plataformas apresentassem informações sobre as providências adotadas no processo de desinformação, o que pode conceder novo fôlego às discussões legislativas, especialmente em um ano que será marcado por eleições gerais.

Por Henrique Rocha e Jéssica Guedes, sócio e advogada do Peck Advogados. Postado originalmente no portal Análise Editorial.

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