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Tema da proteção das marcas já tem alcance internacional como a própria internet e precisa ser respeitado não apenas dentro dos ordenamentos jurídicos tradicionais, mas também transportado para os metaversos

Metaverso definitivamente foi um dos assuntos mais comentados nas redes em 2021 . Geralmente associado aos temas NFT, criptomoedas, “games play to earn” e avatares, essa realidade virtual interoperável, que traz consigo uma Internet imersiva, vem levantando grande interesse do mercado e provocando diversos debates, inclusive jurídicos.

Com maior destaque após o anúncio do rebranding do Facebook, acompanhamos a empreitada de várias empresas de tecnologia em direção ao metaverso. E com as marcas não poderia ser diferente.

Recentemente, a Adidas anunciou sua entrada no metaverso, com a venda dos seus tokens não fungíveis (NFTs), o que rendeu uma arrecadação de mais de US$ 22 milhões (cerca de R$ 125 milhões) em pouco tempo. A previsão da Bloomberg Intelligence é de que as oportunidades de mercado no metaverso podem chegar a US$ 800 bilhões em 2024 . A Gucci já comercializa bolsas e sapatos no Roblox. Outras marcas de peso como Balenciaga, Louis Vitton e Nike já desenvolveram skins para personagens nos jogos Fortnite e League of Legends.

Embora muito ainda se discuta a respeito de jurisdição no metaverso, à medida em que as relações sociais se intensificarem nesse ambiente digital, teremos reflexos efetivos no mundo analógico e essas questões terão que ser enfrentadas para assegurar a aplicação da lei para reger as relações e resolver conflitos.

Nos aspectos atinentes à proteção da propriedade intelectual, a atenção dos titulares deverá ser constante, com a intensificação do monitoramento de infração aos direitos de propriedade intelectual no universo digital. Será necessário adequar os contratos de licenciamento de marcas e conteúdo, para prever expressamente as possibilidades e formas de exploração nesta nova realidade virtual.

E os problemas já são reais. No que se refere à infração marcária, pode servir como parâmetro o caso AM Gen. LLC vs. Activision Blizzard, Inc. . A pretensão da AMG, fabricante e detentora dos direitos dos veículos táticos de defesa “Humvee”, foi relacionada à eventual violação de marca registrada, proposta contra a Activision Blizzard, Inc. e Activision Publishing, Inc., por ter sua marca e veículos representados em diversos momentos no jogo Call of Duty.

No caso, a Corte americana entendeu pela não caracterização da infração marcária. A decisão foi baseada no teste de Rogers, que traz os parâmetros para o balanceamento entre direito de liberdade de expressão, garantido pela Primeira Emenda da Constituição dos EUA. Prevaleceu a liberdade de expressão, já que o uso de Humvees em jogos como Call of Duty tem relevância artística pois “evoca uma sensação de realismo e vivacidade para o jogador” .

A decisão evidencia como esse cenário de convergência entre os mundos real e virtual irá requerer adequações legislativas. Denota também a necessidade de buscar medidas de uniformização de entendimento com abrangência global para uma proteção mais adequada.

Como se vê, ainda há muitos desafios para garantir a Proteção da Marca Digital em todas as interfaces que surgem devido à inovação tecnológica. Esta questão não afeta apenas as empresas proprietárias deste ativo intangível tão valioso, mas tem impacto sobre os consumidores, visto que a proteção marcária visa evitar confusão e erro junto ao público que se relaciona com aquela determinada marca. Além disso, também há questões relacionadas ao combate à fraude e demais crimes que ocorrem quando se dá espaço para os “grilheiros digitais”, que vão de aproveitadores parasitários até golpistas.

Ainda precisamos avançar muito para garantir maior proteção e evitar inclusive o fenômeno da diluição de marca na internet, que é algo que também ocorre quando não se consegue que a audiência vá para o local oficial em que a marca está, por causa da distribuição desordenada de presença da marca a partir dos próprios stakeholders que criam perfis e páginas como representantes da marca e podem inclusive trazer diálogos contraditórios à sua missão, visão e valores e associar a marca a conteúdos não condizentes com a mesma.

O tema da proteção das marcas já está no âmbito dos tratados, já tem alcance internacional como a própria internet e precisa ser respeitado não apenas dentro dos ordenamentos jurídicos tradicionais, mas também transportado para os metaversos, com a criação de uma Corte que possa decidir e julgar de forma célere as questões e garantir o cumprimento da legislação nestes novos espaços.

Por Patricia Peck, Leandro Bissoli e Ana Silvia de Moura Leite Piergallini, sócios e advogada, respectivamente, do Peck Advogados. Postado originalmente no Proxxima.

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